quarta-feira, 29 de junho de 2011

Andrea Doria

Tento disfarçar – e disfarço para mim mesmo. Ainda me lembro das palavras dela, nítidas, falando comigo. É um tempo que não se dá para esquecer... Tempo, esse, vivido com ela, em que recusamos muitas coisas. Recusamos nos prostrar, nos embebedar. Discordamos dos verbos, substantivos, pretéritos e palavrões.

Tento disfarçar mas sua imagem ainda me assombra em uns dias. Não digo, todos. Não generalizo. Mas sei, eu sei, o quanto é real. Palavras cantadas, sua voz doce, seus conselhos amigos. Lembro-me das vezes que não via mais nada de possibilidade no mundo e concluía: “não entendo”. No meu não entender, ela me entendia. “Eu sei, é tudo sem sentido”...

No meu ponto de vista, hoje sou alguém melhor. Não quero só reclamar. Reclamo, é claro, mas reconheço os crescimentos que a vida permite. Gloso mais, ouço mais, levanto-me mais. Conheci pessoas, conheci lugares, tempos. Poesia... muita! E de tanta poesia tenho me enchido. Devo, é claro, dizer que minha poesia é feita do improviso; e, sei lá, acho que é coerente, pois a vida também é toda improviso.

Ah... essas constatações! Tão verdadeiras, tantas verdades. E eu me lembro dela.

Uma vez, queríamos um céu só nosso. Outra vez, queríamos um mundo melhor. Coisas, coisas, coisas que só nós poderíamos coisar. Eu clamava por silêncio... e ela vinha com as melhores palavras. Eu clamava por amigos... e ela vinha ser a amizade perfeita. Clamava por água e ela matava minha sede. Pensava: “meu Deus”...

Sinto sua falta em dias normais. Como disse, tento disfarçar. Mas nem todos os dias são normais e por isso não é sempre que sinto falta. Não vivo de utopias. Não sou tão romântico. Não sei olhar para o vento e lembrá-la. Não sei olhar para horizonte e ver seu rosto lá. Não ouço uma canção com seu nome. Sou do tipo mais sofredor, que sente a falta na hora comum, no instante comum; sem esforço.

Queria alguém para conversar. Era sozinho. Era só eu.

Mas ela veio numa hora que se fez boa.

Não rebatia minhas palavras; amava-me.

Amava-me?

Um dia ela sorriu diferente. Meu Deus... E de repente havia muitas questões, muitas pessoas, muitas nuvens, cores demais. E de repente era o mundo mais sagaz, mais ousado, sem segredos. E me vi sozinho, me vi sem ela.

Nunca soube sobre a causa da sua indiferença. Uns dizem ter sido amor demais. Veja só: amor demais não é ruim, não. Não entendo o motivo da sua partida. Não concordo com o seu abandono.

Paro para pensar e percebo que talvez o recado do fim já tinha sido me dado logo no início... “Eu sei, é tudo sem sentido”.

Não sei. Realmente, me senti bem perdido, me senti triste, sei lá... Era muito ruim. Fiquei triste demais mas hoje nem tanto. Só um pouco. E das faltas que me atordoam ainda, a maior é pensar se ela, hoje, constata como estou constatando agora.

Hoje pensei nela ao lembrar-me da frase de Guimarães Rosa: “A colheita é comum mas o capinar é sozinho.” De certo... o capinar é sozinho, e para alguns, como eu, é repleto de lembranças de uma colheita que palavra nenhuma conseguirá denominar.

E o momento de parar chegou. “Eu sei, é tudo sem sentido...” Sempre foi, sempre será – respondo para mim mesmo.


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Indispensável conhecer a música "Andrea Doria", de Legião Urbana.

Deu pau na hora de criar os atalhos para os links, então cansei de insistir. Aí ficou feio mesmo. Estão aí:

http://letras.terra.com.br/legiao-urbana/46928/ >>> Letra

http://www.kboing.com.br/legiao-urbana/1-1023624/ >>> Música

domingo, 19 de junho de 2011

Versos Drummondianos soltos (Poesia mais errante ainda)

Saudade

Saudade de casa
que não morei.
Saudade da mulher
que não conheci.
Saudade do amor
que ainda não vivi.


Características

Maria fazia versinhos,
Helena costumava orar,
Gilberto não tinha nada de santo,
mas era poeta e sabia rimar.


Leia e releia: amor é difícil

Ao amor dediquei minha vida
veja você, estou patético:
ando pouco
falo pouco
sinto pouco
como pouco
quase pouco nada sei: insisto.
Sei lá, sei lá, o amor tem disso
dentre outras coisas.


Timidamente sobre Minas Gerais

Minas Gerais
(não tento, não tento)
Sua poesia concreta
Seu olhar ressabiado
(não ouso, não ouso)
Montanhas avessas ao mundo
de avessos versos
de avessos prazeres
e demais sentimentos.
Dou-lhe razão
(não posso, não posso)
de roubar o coração
de quem um dia te conhece
e não pode mais esquecer.


Acessos