A grande panela: guardávamos tudo nela, com perspectivas de
um dia de cozimento. Essa panela era do
mundo. E, sim, houve épocas em que a vontade de que daquela panela saísse algo
de saboroso, de proveitoso, foi maior que a vontade de cozinhar. Ficávamos nos
preparativos. A panela era rude, forte,
não trincava nem nada.
Eu mesmo (quem diria!) depositei nela alguns poemas, alguns
escritos, algumas visões de futuro – bobagem. Alguns depositaram sentimentos
muito profundos, uns inclusive que não eram conhecidos. Os escritores mais
tradicionais fizeram questão de depositar toda a modéstia recolhida em anos e
anos de dedicação aos livros publicados, mas, de certa maneira, emitiam o mesmo
frenesi que os escritores chamados de “mentes mais abertas”. O que é até
justificável porque, se você ver bem, escritor é a mesma coisa sempre.
Certa vez, não coube mais nada na panela. Sim, aquela paradoxal
panela não suportava mais nenhum conteúdo. O que fazer? Esta panela era o mundo.
Como fazer? Fiquei me perguntando como eu agiria dali para frente mediante
àquele marco histórico. Sim, afora qualquer discussão filosófica ou
intelectualista acerca das coisas, eu considerava aquele momento um fato
histórico. Pois bem, perguntei-me, perguntei-me e não obtive resposta – e isso
me deixou profundamente confuso, para não dizer encabulado. As outras pessoas
eu não sei se fizeram esse questionamento, se entraram nesse parafuso.
Aliás,
as outras pessoas foram questionando tanto, se envolvendo tanto com o problema
da panela... e se esqueceram. Esqueceram-se da panela! Daquele objeto de culto,
daquele dispositivo racionalista, religioso, puro, emblemático. Haviam se esquecido!
Sinceramente, vim aqui registrar esse caso da panela,
pouquíssimo certo se também me esqueci. Ou ainda, por que eu me lembraria? É um
caso sério, com certeza. E que coisa estranha é a memória, concluo, que me
embaraça e me consome, tal como panela. E que coisa estranha é o tempo, que
conclui, feito tampa.
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