quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

O betinense e o chão

Por algum tempo vivi em Betim. Mas ao contrário de Drummond, que “principalmente nasceu em Itabira”, eu não nasci aqui. Betim me pegou de surpresa. Acontece que meus pais, betinenses, em 1992 não tinham condições de pagar hospital - a essa altura, o hospital público Nossa Senhora do Carmo já havia se tornado o Hospital da Unimed que conhecemos, único de Betim naquela época. Desta forma, de papel passado não sou betinense: sou esmeraldense. Em Esmeraldas, aliás, nunca pisei: saí de lá um dia depois de meu nascimento nos braços de minha mãe e nunca mais voltei. Pisei mesmo foi em Betim! Sou betinense de chão, como muitos outros. Com um ano, minha mãe diz, já andava os cômodos de minha casa. E conforme eu ia crescendo, minhas fronteiras aumentavam. Aos poucos, já pisava no asfalto da Rua São Salvador e, acompanhado, ia para o Jardim de Infância. E depois já atravessava a Avenida Amazonas sozinho para ir à escola. E ao centro da cidade. E ao cinema. E ao meu primeiro emprego. E aos poucos, pés no chão, Betim me entregava a novos lugares, porque a vida de adulto exigia um rompimento: Contagem, Belo Horizonte, Brumadinho. Estudos, estágios, novos olhares. Sim, Betim me entregou a muitos lugares. E muitas vezes saía eu daqui e rumava para um dia inteiro longe. Hoje, depois de muito tempo, tenho a impressão que ao sair de casa,  quando subo a Governador Valadares rumo à BR para pegar o ônibus e ir trabalhar, Betim faz um contrato silencioso comigo, como se dissesse baixinho “vá, mas volte a pisar aqui ainda hoje”. E eu sempre volto. Se há algo que constitua o ser betinense, aliás, talvez não seja morar em Citrolândia ou Marimbá. Tampouco conhecer a Várzea das Flores, a Casa da Cultura, a pista de caminhada ou o viaduto do PTB. E talvez nem seja ser antigo na cidade ao tal ponto de ter conhecido a antiga barreira, a antiga Makar, o antigo cinema, ou até mesmo, quem sabe, conhecido a própria Josefina Bento. Ser betinense – e disso estou buscando alguma certeza – é, sim, ter que ir longe daqui, mas saber que Betim sempre guarda em sua memória um bom motivo para voltar. Nos rosto do betinense, aqui e ali, sempre percebo uma certa pressa, um certo sentimento, uma certa memória escondida de quem carrega dentro de si uma lagoa, um rio, complexas estradas, poeira, paixão, uma igreja: uma cidade pulsa, lá no fundo, na alma do betinense, não o deixando esquecer onde seus pés encontram o seu verdadeiro chão.

Um comentário:

  1. Ai que lindo! Amo nossa cidade e me sinto triste quando vejo estampado nos jornais que as mazelas das grandes cidades chegam a passos largos em nossa querida Betim! Triste por ver que meus filhos não poderão brincar sozinhos na e nem ficar no portão conversando até alta madrugada como tantas vezes fiz! Tento eu educar meus pequenos para que eles contribuam para a oxigenação desta nossa cidade tão amada!

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